Biologia da Paisagem

Liquens em tronco de palmeira-imperial.

Líquens em ambiente urbano

Os liquens, também chamados de fungos liquenizados, não são um organismo propriamente dito e nem uma espécie de ser vivo. São o nome dado a uma associação de organismos simbiontes, ou seja, seres que vivem juntos e dependem um do outro de alguma forma, compostos por uma espécie de fungo e outra espécie de bactéria fotobionte (que realiza fotossíntese). Não é uma espécie em particular de fungo e nem de bactéria, mas um conjunto de espécies possíveis desses grupos, o que permite inferir que há muitos tipos de liquens diferentes. 


Os fungos mais comuns a comporem os liquens são os Ascomycota e os Basidiomycota e as bactérias que costumam associar-se a eles são as Chlorophyta e as cianobactérias. A definição da Associação Internacional de Liquenologia (IAL) diz que são “uma associação de caráter permanente entre um fungo e um componente fotossintético do qual resulta um talo estável”. 


Talo é o nome dado à parte visível da associação entre o micobionte (componente fúngico) e o fotobionte (componente fotossintético) e é muito importante para a identificação do líquen, uma vez que a morfologia e química do talo é um componente variante na associação: pode ser folioso, crostoso, esquamuloso, gelatinoso e fruticoso. Outra característica relevante para a discriminação dos líquens são o tipo de substrato em que vivem, o que será abordado a seguir. 

Mas por que esses organismos vivem juntos?  

É uma relação de ganha-ganha. Os fungos obtêm nutrientes (hidratos de carbono) e os componentes fotossintéticos recebem água, sais minerais e um suporte estável (abrigo). Isolados, eles não têm tanta vantagem como acontece na associação ou mesmo podem sequer sobreviver. Dessa forma, sob o ponto de vista ecológico, a relação pode ser definida como parasitismo ou mutualismo, com significativa tendência de os fungos serem mais favorecidos, até por se beneficiarem com alimento oriundo da fotossíntese, metabolismo altamente complexo que não realizam. 

Onde e como vivem?

Os liquens são amplamente distribuídos no ambiente terrestre, desde regiões tropicais até locais inóspitos como desertos e polos, como na Antártica, em rochas (saxícolas), solos (terrícolas), plantas, troncos de árvores (epifíticos), e até mesmo em águas continentais ou marinhas. São os primeiros organismos a colonizar áreas sem vida, como rochas nuas após uma erupção vulcânica, onde iniciam as modificações físico-químicas necessárias para que outros organismos p´rogressivamente mais complexos se instalem e prossigam com o processo de sucessão ecológica. Em Belo Horizonte, por exemplo, podem ser encontrados tanto em áreas altamente urbanizadas da região central da cidade, como na Praça da Liberdade, como em pontos mais ajardinados (orla da Lagoa da Pampulha) ou mais isolados, como parques e unidades de conservação. 


Não possuem sistema vascular, estômatos e cutícula, são perenes, ou seja, vivem por muito tempo (até 100 anos) e apresentam como principais fontes de água a névoa, o nevoeiro e o orvalho. O crescimento é bastante lento e gradual, de cerca de milímetros a poucos centímetros por ano. 

Por que é importante o monitoramento desses seres nas cidades? 

Grandes cidades, como Belo Horizonte, apresentam quantidades excessivas de material particulado e contaminantes atmosféricos, como dióxido de enxofre (SO2), monóxido de carbono (CO), óxidos de nitrogênio (NOx), materiais particulados, metais pesados, ozônio (O3), entre outros, devido aos veículos e às indústrias. Esse contexto torna necessário a presença e o aperfeiçoamento de sistemas permanentes de controle para análise da poluição do ar e os líquens têm elevado potencial nesse sentido. 


Esses organismos apresentam relevância histórica no processo de biomonitoramento ou bioindicação de contaminantes, desde a Revolução Industrial na Europa, devido a uma alta sensibilidade a poluentes. Fornecem informações sobre a qualidade do ar a um custo reduzido, em amplas áreas geográficas com elevada amostragem, ao longo de um período e por longo tempo e na avaliação de elementos químicos presentes em baixas concentrações no meio ambiente. Diferentes espécies liquênicas reagem a diversos poluentes de diferentes formas, o que permite prever gradações ou intensidades no grau de poluição atmosférica, por meio da biodiversidade dos liquens, da dosagem de poluentes acumulados no talo deles e da observação de mudanças fisiológicas e morfológicas após o transplante de liquens de áreas não contaminadas para áreas contaminadas. 


Os gêneros de liquens mais utilizados pertencem à família Parmeliaceae, como os foliosos Canoparmelia sp., principalmente C. texana e C. crozalsiana, que apresentam-se abundante em cidades não litorâneas e de grau de poluição elevado no Brasil, e Parmotrema sp., principalmente P. tinctorum e P. delicatulum, devido à facilidade de identificação da espécie. Liquens de outras morfologias (como fruticosos e crostosos), dos gêneros Usnea sp. e Teloschistes sp., por exemplo, são também utilizados, além de Xanthoria sp. e Ramalina sp. 


Em Belo horizonte (MG), observa-de a presença de liquens vermelhos em locais muito verdes e preservados, como o Parque da Serra do Curral. 

Liquens em tronco de palmeira-imperial.

Liquens presente em tronco da palmeira-imperial (Roystonea oleracea), na orla da Lagoa da Pampulha (BH). 13/01/2021

Literatura


Literatura: VAZ, Raissa Pieroni. LEVANTAMENTO PRELIMINAR DE LIQUENS EPIFÍTICOS COMUMENTE UTILIZADOS COMO BIOINDICADORES DA QUALIDADE DO AR NA ESTAÇÃO ECOLÓGICA DA UFMG, BRASIL: GÊNEROS PARMOTREMA E CANOPARMELIA. 2012. MONOGRAFIA APRESENTADA AO DEPARTAMENTO DE MICROBIOLOGIA DO INSTITUTO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS COMO REQUISITO PARA OBTENÇÃO DO TÍTULO DE ESPECIALISTA EM MICROBIOLOGIA.. Disponível em: https://www.ufmg.br/estacaoecologica/wp-content/uploads/2020/11/2012-VAZ-Raissa-Pieroni-liquens-epifiticos.pdf. Acesso em: 17 jan. 2025. 

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