É quase unanimidade - ao menos no discurso - que a arborização de ruas e avenidas faz bem para as cidades. Todos os benefícios das árvores (funções e serviços ecossistêmicos) para a vida das pessoas podem ser vistos aqui. No entanto, a discussão deste artigo é mais profunda: qual a relevância de se plantar árvores nas ruas, avenidas e praças das cidades para o contexto atual de mudanças climáticas?
A resposta para essa pergunta depende do ponto de vista da análise. A relevância da arborização de ruas para mitigar os efeitos da elevada concentração de CO2 na atmosfera contemporânea é baixíssima, quase nula, portanto desprezível. As árvores presentes no centro de Belo Horizonte, por exemplo, são tão pouco relevantes numericamente diante das árvores presentes em uma floresta, que não fazem praticamente nenhuma diferença na quantidade de carbono estocado. Isto é, embora estoquem carbono, isso não será considerado por ser um percentual irrisório.
No entanto, se o assunto for a RESILIÊNCIA das cidades para lidar com as mudanças climáticas, essa arborização tem elevada relevância. Em um planeta cada vez mais quente, a arborização urbana será cada vez mais necessária, isso porque ela causa maior sombreamento onde residem ou transitam grande parte da população mundial. São potencialmente bilhões de pessoas que sentiriam um pouco menos os efeitos das mudanças no clima sob o ponto de vista da sensação de calor causada pela exposição aos raios solares. Árvores em ambiente urbano diminuem de forma significativa a sensação térmica sentida pelos moradores, mesmo sem alterar em nada a dinâmica climática regional.
Vamos, aqui, fazer um exercício de imaginação. Imagine um morador de Belo Horizonte caminhando em uma rua com poucas árvores lá da década de 60 durante o verão. Naquela época, as médias de temperatura máxima em fevereiro, mês mais quente do ano, eram de 28ºC. Agora, imaginem essa mesma rua nos dias de hoje, com uma média máxima mais alta (está em 29ºC na normal climatológica mais recente), porém muito mais arborizada. É bem verossímil pensar que os moradores sentiriam mais frescor ao caminhar nessa rua num dia de sol HOJE do que naquela época, única e exclusivamente por causa da presença maior de árvores. O sombreamento atual compensaria o recente aquecimento extra do ar.
Isso é a RESILIÊNCIA: mesmo num mundo mais quente, as cidades podem criar estratégias para lidar com a nova realidade e não serem reféns dela. Se a temperatura subir ainda mais até o final do século, por exemplo, será muito necessária a presença massiva de sombras de forma a aliviar a sensação térmica. Não impedirá uma queda na qualidade de vida geral, mas será uma queda menor pois o os benefícios estarão estrategicamente posicionados onde mais é necessário: nos locais mais habitados e frequentados pelas pessoas.
A mesma quantidade de árvores plantadas em um parque, por exemplo, traria menos benefícios sociais pelo simples fato de influenciar a vida de muito menos gente. O cerne desta discussão passa pelo impacto social do plantio e não por aspectos ambientais. Se a finalidade é o estoque de carbono, vale investir em trabalhos maiores, que envolvam, além das cidades, parques, florestas, as mais diversas categorias de Unidades de Conservação, áreas rurais, de Reserva Legal e APPs. E, nesse sentido, o Brasil deve trabalhar para ser referência mundial devido a sua área florestável muito ampla.
Extrapolando este raciocínio para outros efeitos negativos da mudança do clima, é possível diminuir seus impactos mesmo que as ameaças permaneçam presentes (e aumentando) o tempo todo. Jardins de chuva em vales (e topos adjacentes) podem reduzir a intensidade das enchentes, mesmo que os volumes de chuva tornem-se cada vez mais extremos, e a fiação elétrica subterrânea pode reduzir os cortes de energia durante vendavais, ainda que a frequência das ventanias aumente.
O combate às mudanças climáticas passa por várias frentes e vertentes, do nível mais global ao mais local, desde o imprescindível combate às causas (emissão de gases causadores de feito estufa) à fundamental mitigação dos efeitos, por meio de cientistas do clima, autoridades, instituições e população civil. O discutido neste artigo em nada influencia nas causas, porém apresenta muito alta relevância para o dia a dia dos cidadãos comuns, o que deve ser considerado todo o tempo para manter uma mínima qualidade de vida para todos.